domingo

Quase imperfeito todo perfeito

Há qualquer coisa de tão perfeito numa manhã de Domingo outonal, em que o frio não é completo nem o calor se ausentou de todo e no entanto, este meio-termo quase imperfeito, parece encaixar-se nos pensamentos dos meus bocados. Ou o que me falta. Será pois, a imperfeição de mim mesma a perfeição da natureza a demonstrar o quão inacabados serão os homens, eu. Blogados de mim a cogitar sobre outros tantos, que tento no dia-a-dia aperfeiçoar e desperto - tal qual uma estação a suceder a outra que parte - para os meus muitos defeitos, cada vez mais, sem achar virtude que me torne o objecto da busca. E pergunto: A perfeição do meu Domingo é achar a minha natureza inacabada para todo o sempre. Sem interrogações no final, pois de retórica vem isto a propósito. 
 
 

quarta-feira

Contacto

Não sei em que parte do meu discurso é que deixam de me entender ou ouvir - seja em que situação for - mas a verdade, é que deixam. Vem isto a propósito, de não me olharem nos olhos quando me dirijo a outrém e essa ser a principal razão para não atenderem ao meu pedido ou perceberem a mensagem da minha autoria. Claro que metade do que é dito é captado e os outros 50% ficam no tinteiro, como diría o povo. Ora esta realidade distorcida, acarreta as maiores confusões e até dissabores. Não se trata de uma surdez velada, mas uma falta de contacto visual que dificulta a chegada da mensagem entre o emissor e o receptor, obrigando a que se repita o processo com o esforço da emenda do primeiro pedido. Dificil de perceber? Bastante. E muito cansativo.


 

sábado

Respeito III

Esta história do respeito está a ficar parecida com uma série televisiva sem fim. Vem isto a propósito da simples palavra obrigado. Ou para modernizar, obrigadinho, como ultimamente e raramente tenho escutado. Porque na verdade, cada vez é menos que uns e outros agradecem o gesto, a simpatia, o atendimento, a retribuição. Pergunto-me porquê e não acho resposta. Será efeitos da crise economica? Talvez não. Talvez seja uma questão educativa, ou melhor reactiva, pois se os que não dizem a palavra já têm lingua e dentes para proferirem os maiores impropérios, decerto terão cuspo suficiente para soletrarem obrigado se a isso tivessem sido encaminhados. Não é geral, mas está a ficar generalizado.
 
 

quarta-feira

Respeito II

Não sou nenhum exemplo da moral e bons costumes. Que o digam os meus pensamentos. Melhor não. Mas ele há certas coisas que ultrapassam o meu entendimento e gosto, quiçá a minha capacidade de respeito por uns quantos, pois se é disso que falo. Hoje, no meio do trânsito, um condutor que decerto ía tirar o pai da forca, apitava furiosamente para o outro à sua frente que manobrava para estacionar. Algo devagar, diga-se. Eu arrumei ao lado. Quando finalmente teve a estrada desimpedida para seguir a toda a brida, levantou o punho e gritou velho do caraças várias vezes. O tal velho saíu do carro. Devagar. E de bengalas. O que me chocou não foram os apêndices para caminhar. Mas o sublinhado de velho. Velho. É que ele já lá chegou. O outro, mesmo animado de velocidade furiosa, a ver vamos.

 

domingo

Pequeno grande mundo

Os privilégios de se viver na cidade grande estão na mesma proporção para os seus prejuízos. Não vou enumerá-los por evidentes. Vem isto a propósito, de numa manhã de Domingo - e manhã cedo - toda a cidade parecer estar adormecida. Ou será apenas o meu bairro, a minha rua, o meu prédio, a minha casa, a minha sala? É que num instante o nosso pequeno grande mundo é apenas o sitio onde estamos sentados e tudo ao redor é inexistente ou desconhecido. Nesse mesmo intante, na minha sala, na minha casa, na minha cidade ruidosa o único som que me chegou numa manhã de Domingo foi o dos pássaros, e eu surpreendida por ter ensinado o ouvido a trânsito e gritos, maravilhei-me, despertei-me, quis acordar o prédio, a rua, chamar o bairro para que viessem escutar o mesmo que eu, que não era loucura minha, ouvíam-se passarinhos na cidade grande. Por uns minutos alei-me e fui com eles, talvez blogados de mim. Depois ouvi uma sirene de uma ambulância e duvidei dos meus bocados.

 

terça-feira

Respeito

Preciso de tranquilidade no final do dia. Preciso desse pedaço de sossego para que os meus bocados se reforcem e se retornem num todo para o dia seguinte, podendo então voltar a desmembrar-se e suportar a ruptura, repetindo a integração do ciclo. Por isso, quando aqui venho e escrevinho, é natural que nesta actividade, embora não tendo a prosápia de escritora, exiga a mesma paz. Alguém, ignorando a lei do silêncio e do respeito pelo seu semelhante a partir das 22h, resolveu entrar noite fora, quiçá espantando-a, a dar umas valentes marteladas, a ritmo incerto. De inicio, achei que era coisa fortuita, estaquei o que fazía e retomei; Mas perante o seguimento furioso e insistente, a minha capacidade de concentração apenas e tão só se focou na contagem das marteladas, o que denota um comportamento obssessivo do martelador mas igualmente de minha parte. Do respeito pelas horas do descanso, da lei e dos demais moradores do prédio, nem vê-lo. Provavelmente terá ficado esborrachado sob uma das 1479 pancadas que escutei.
 
 

sábado

(O meu)Telhado de vidro

Não sei se da vida que levamos, não sei se da vida solitária a que alguns mesmo acompanhados se sentem, tenho vindo a reparar que a maioria das pessoas comporta-se nas suas actividades comuns com um tique. Entre os afazeres que desenvolvem, lá estão elas a pigarrear naquele tom especial ou a coçar o lóbulo ou a afagar o lábio superior ou a beliscar a sobrancelha furiosamente. Não são gestos isolados e ocasionais, são repetições que acontecem dentro do mesmo quadro, cenários que já sei quando têm lugar, uma espécie de manias. O curioso, é que fora isto, são absolutamente normais, dentro dos parametros entendíveis como "normal". Vem isto a propósito do que é sujeito ao standard e o que é desvio. E questiono-me: qual o meu tique? Qual a minha normalidade? Pois se os demais não se aperceberão dos seus pequeninos "defeitos", também eu não terei a capacidade de ler os meus. Serão blogados de mim? Ou farão estes pedaços um todo absolutamente necessário para me constituír enquanto existência de um ser?
 
 
 
 

quarta-feira

Tubo de ensaio

Há um par de anos, um norte-americano lembrou-se de fazer uma peregrina experiência de se alimentar durante um mês seguido apenas e tão só no MacDonalds. Em mais nenhum outro sitio de restauração ou/e em sua casa ele tomou as principais refeições e colações durante trinta dias seguidos. O resultado para aquela alma - e digo-o com propriedade, pois ía quase desta para a melhor - no final deste brilhante ensaio, revelou que a alimentação daquele sitio não é indicada para manter uma pessoa saudável. Ocorre-me um adjectivo: Genial. Vem isto a propósito da Troika querer baixar o salário minimo. Proponho que façam, à semelhança dos trinta dias do outro, o mesmo com os Euros que querem disponibilizar para os Portugueses. Experimentem os que querem baixá-lo, se governem durante um mês apenas, e vejam no final como vai a vossa saúde.
 
 

domingo

Leituras & Desgostos

Durante esta semana fiquei deveras decepcionada com alguém que tinha em consideração. Vem isto a propósito de idéias preconcebidas que fazemos sobre outrém. Esse alguém, a meio de conversa que mantinhamos, atirou-me que não gostava de ler. Fiquei siderada. Mas o meu desgosto não se ficou por aí, pois passado um tempo, constatei que essa mesma pessoa se entretinha a desfolhar ávidamente as páginas de uma publicação cor-de-rosa, seguindo na ponta do dedo, as legendas que acompanhavam as fotografias tiradas à socapa  pelos papparazi. Não contente com tal episódio, ainda me relatava os factos dos quais se punha ao corrente. Foi demasiado para mim. Não consigo encarar a pessoa da mesma maneira e creio que gosto dela menos do que gostava.
 
 

quinta-feira

Morder a língua

Embora acusada de ter um feitio dificil (e não usarei outros adjectivos) a educação a que fui sujeita impede-me de referir o que tenho muitas das vezes vontade de lançar boca fora. E digo lançar, porque a força e o ímpeto com que fico são de tal forma intensos, que mais parecem um vómito. Mas - e há mas nesta história - a refrear-me a bendita educação burguesa de boas maneiras sobre nem tudo é para se dizer, contenção, contenção, a cozer-me a boca e a permitir ouvir as alarvidades alheias sem lhes dar o troco na medida igual, retorquindo polidamente e afastando-me a morder a lingua, para que esta não tenha uso a não ser a dor. Um dia, sonho que terei um dia sem filtros, em que farei o gosto à garganta e tudo direi de prontidão. Nesse dia, podem usar todos os adjectivos.
 
 

segunda-feira

(Re)Começaram as aulas

Como um estalar de dedos, parece que todos os estudantes surgiram da terra e apareceram para ocupar todos os espaços possíveis e imaginários. Vem isto a propósito de ter começado o ano escolar. Mas não só. O trânsito alucinado, as longas filas para qualquer transporte e para almoçar, e no regresso uma mesma dose de paciência para aguentar buzinadelas, os meninos que vêm carregados de hiperactividade e guincham como animais enjaulados, a triste constatação de que férias, só mesmo no ano que há-de vir, assim nos facilite a vida que a Troika permita.
 
 

sexta-feira

Silêncio procura-se

Tenho alguns locais de eleição onde religiosamente vou há vários anos e se desaparecessem ou alteressem o seu MO, confesso, sentir-me-ía defraudada. São sitios onde recorro para me servirem como necessidade básica, mas igualmente me restabelecem na paz e tranquilidade que gosto e procuro. Não tenho apetites por cenários mundanos publicitados nem concorridos por caras conhecidas. Não gosto de multidões nem decibéis agressivos assim como conversas desmesuradas só para manter um diálogo entre os clientes, que me exaustam e  anseiam pela fuga. Preciso de silêncio, não de um silêncio sepulcral enterrado, mas de um silêncio pacifico em que sabem respeitar-me por me saberem como sou, sem invasões nem agrados excessivos. Preciso que me deixem entrar e despreocupada pelos meus bocados, todos eles sintam a seu tempo, a ausência da cidade.
 
 

terça-feira

(In)Competências

O nosso juízo está de tal forma organizado segundo uma escala ilusória que nem mesmo para nós próprios, temos a capacidade de discernir qual a real e verdadeira medida de competência dos outros perante a nossa e vice-versa. Confuso? Claro que sim. Vem isto a propósito de estarmos constantemente a avaliar o grau de competência dos outros comparativamente ao nosso. Ou seja, o nosso é sempre indubitavelmente superior. Não é verdade? Raras vezes que o não é. Pois quando não nos deitamos a fazer estas comparações, é exactamente quando aceitamos a realidade, ou seja, encaramos que o outro é de facto, melhor que nós. Mas vem isto e ainda a propósito, que a nossa realidade muito virtual, nos reflecte um grau de auto-competência muito mais elevado do que aquilo que se passa: Porque nos sussurramos sou bem melhor que tu? E afastamo-nos irritados. Com quem?
 
 

sábado

Poesia (É preciso)

A abstracção do real pela poesia não é apenas um exercicio do belo. Para mim, que o faço como aprendiz do b-a-ba e me comovo quando a leio, não simplesmente por alguns pedaços do sentir de mim, mas um todo do que sou, faz-me falta tê-la por perto e dela alimentar-me de quando em vez. Uma espécie de nutriente do qual careço para me manter viva e amorosa, tornar presente a fragilidade do que é ser humano e do que é ser artista. Não o sou, não tenho essa presunção. Lá porque me ensaio em riscos de poesia e me faz bem tentá-la, a maioria das vezes desperdiço-me em muito papel rasgado por me achar incapaz de a escrever. Vem isto a propósito das saudades que tenho de o fazer, também dos receios de aí voltar a esse campo maravilhoso mas minado e encoberto.

 

quarta-feira

Ataques

Preparava-me para reunir os meus blogados para um pedaço de escrita tranquila, quando me tocaram a porta. Insistentemente diga-se, o que desencadeou um automatismo de negação automático na minha pessoa, fazendo recolher todos os meus bocados como um exército pronto a defender o forte. Uma venda directa. Recusei. Primeiro com um sorriso amarelo para despachar a coisa, mas ante a série de perguntas com que fui flechada, disparei também, e voltei a repetir mais do mesmo e com uma carantonha a ver se percebíam que era não definitivamente. Insistiram. Já a fechar a porta e a repetir pela terceira vez a mesma frase batida e visivelmente irritada, o telefone tocou. Salva pelo gongo, pensei! Era outra venda. Incapaz de me controlar, usei pela quarta vez a mesma frase, não dando sequer tempo a quem estava do outro lado para retorquir. Vem isto a propósito,  das condições de emprego do nosso País. Vem isto a propósito da agressividade que se usa para entrar nas nossas casas. Vem isto a propósito da agressividade que despoletamos para escorraçar quem se arroja ao nosso território.

 

domingo

Caixa-Forte

Reúno uma mão de amigos e não sinto falta de mais, sinceramente. Há quem diga que dos verdadeiros nunca são em número suficiente, mas os que me estão perto bastam-me, não pretendo outros com todos os seus defeitos que lhes reconheço, que a mim me apontam e agradeço. Vem isto a propósito, de bastas vezes me achar na condição de confidente de puros estranhos. Dos que nada me são, daqueles que só me dirigem o gesto do cumprimento polido e um dia - na mais perfeita incongruência de ambas as partes - acharmo-nos num confessionário sem esforço, em que eu sou mera escuta e os meus bocados são retalhos de pedra. Talvez por isso, me achem uma caixa-forte capaz de guardar o que ouve para todo o sempre, sem devassa de boca e orelha alheia.

 

quinta-feira

O que apontam é o que fazem

O meu companheiro inseparável é o livro que sempre anda comigo para qualquer lugar onde vá, seja longe ou perto, não o dispenso. Senti-lo comigo dá-me a segurança de que não estou sózinha, as suas palavras guardadas entre páginas estão sempre à distância dos meus olhos quando delas precisar, seja para me ausentar do cenário, da conversa, do tempo que não passa, seja pelo prazer do texto que nelas se encerra. Vem isto a propósito, de já bastas vezes ter sido insinuado de que este meu livro mais não é do que uma peça decorativa, uma espécie de uma outra carteira suplementar que carrego para dar a aparência de uma certa intelectualidade, um status, um complemento à toilete. Nem sequer rebato a piadinha, não me merece o esforço dum pedacinho de um qualquer retalho meu. Deixo ao sabor e consideração de quem quiser explorar o tema e proliferar na ignorância. Sendo bem certo que a dedução que faço é que se devem estar a ver ao espelho.

 

segunda-feira

Maneta&Cegueta

Impressionada com o desiquilibrio entre algumas divisões de trabalho quanto a atribuição de tarefas, os meus pedaços resolveram juntar-se num todo. A união faz a força, diz o provérbio popular. Cautelosamente, abordei a questão: não quería ferir susceptibilidades, ser mal-entendida quanto à aceitação do que havía sido entregue e principalmente ser apelidada de queixinhas. Mas logo que abri a boca, a justiça aproximou-se de pala no olho e zarolha, começou a desferir atamancadamente, bordoada em cima de mim. Vem isto a propósito, do que ocorre na generalidade no nosso pequeno paraíso. Da minha parte e no imediato, engoli em seco e a dor que senti pelo que ouvi e temía, foi tudo o que apanhei. Mas passadas as primeiras pancadas, endireitei o esqueleto e encarei aquele boneco desajeitado, cegueta e maneta, desarticulado de espinha vertebral, apanhei os meus sentires, regressei ao meu todo e rematei: Tenho dito.

 

sexta-feira

Eu escolhi

Há quem já se tenha habituado a ver-me assim, distante, é como me chamam, desconheço se o fazem com o sinónimo de altivez ou de medida. Outros apontam o dedo com o ar de desdém acrescentando bicho-do-mato. E depois há a parcela dos que não me vêem sequer. Ou vejo-os a todos, ouço-os a todos, mas escolhi estar sózinha a maior parte das vezes porque não tenho paciência. Esta é a verdade. Não tenho mais nem menos que todos eles, sou par deles, mas não aguento aquelas conversas, o volume do som, desinteresso-me, aborreço-me, enfado-me de tal forma que fisicamente sinto dores de cabeça, alguma náusea, só penso em correr e fugir, essa é a única imagem que me fica presente. Sempre ouvi que quem está mal muda-se. É o que faço. A minha solidão não é um isolamento forçado e tão pouco é triste, são retalhos daquilo que sou e das minhas opções de bem-estar. Entenda-se que eu gosto da humanidade. Mas entenda-se também que os meus sentires não gostam de todos.
 
 

quarta-feira

A capa do livro

A propósito de capas e de livos ou não necessariamente destes mas da analogia destes com as pessoas e do julgamento directo que nós fazemos do que vimos. Quero eu dizer, que aquilo que me ensinaram como regra básica que não se deve tirar conclusões pelo que se vê, mas fazer uma avaliação pelo seu todo - e o seu todo é o carácter, entenda-se - é bonito mas não verdadeiro. Ou reformulando: é verdadeiro, mas não tem aplicação. Ou explicando à terceira: Não o fazem comigo. E acrescentando uma alínea a): Apercebo-me que não o fazem os demais e até eu caio nessa esparrela primária de por vezes não o fazer, não sou assim tão diferente. Vem isto a propósito, escrevía neste longo inicio, de que julgamos todos, como dizem os ingleses don't judge a book by it's cover, numa tradução livre, não julgues o livro pela sua capa, ou que mania esta que temos de tirar conclusões quanto ao que as pessoas são pela forma como vestem, gesticulam ou andam. O pacote exterior tem muita importância, demasiada, e afinal, nos dias de hoje e na pressa que (todos) levamos, é (quase) a única coisa que vemos.
 
 

segunda-feira

Desejos poéticos

Por vezes aquilo que se quer é tão tangível que se chega a crer impossível. Vem a isto a propósito de desejos poéticos. Algo muito pequeno, simples, cru, uma sensação qualquer que chega a ser complicado traduzi-la a outrém pela singeleza do pensar. É nessas alturas que um pedaço de nós se acha extremamente complexo no descodificar das suas emoções. Desiste pelo exasperamento. Mas logo na primeira facilidade, sem combate algum entrega-se à frase de não conseguir explicar porque é só um sentir que o outro nunca há-de entender por nunca o ter sentido. Será? E este outro, assim fará a um outro de novo, e em cadeia, outra vez, e andamos todos nisto a achar que é impossível dizer coisas puras e banais que nos deixam bem e contentes só por serem pequenas e não valerem o esforço, e vai daí: Calamo-nos. Não dizemos nada. Abanamos a cabeça, encolhemos os ombros, dizemos não saber o que temos, mas sentimos uma depressão cá por dentro... e suspiram.

 

sexta-feira

Boa Noite

Porque hoje me permito esticar o tempo e os não-fazeres (termo muito próprio que não pode ser encarado como um neologismo mas ainda assim serve para denominar tudo o que não é tarefa comum e habitual nos restantes dias da semana), podería estar aqui a dissertar e escrevinhar blogadamente. Que é como quem diz: garatujo um bocadinho agora, escrevo outro pedacinho mais daqui a pouco. Vem isto a propósito de que quando se pode, à vontade, parece não apetecer tanto. A ânsia do que não se tem é sempre um apetite mais saboroso e estes retalhos, cosidos a maior da vezes já no final do dia, cansada, valem pelo meu retiro, uma almofada macia que me prepara o sono e me dá as boas-noites. Hoje tenho tempo. Mas hoje só me apetece dizer boa-noite.

 

quarta-feira

Falatórios

Neste todo que me faz, metade mais metade, o que importa mesmo são as imperfeições. Quero eu com isto dizer, que para mim, que permanentemente busco a perfeição no todo, na tentativa - conseguida ou frustrada, não é isso que está em causa -  de um interior mais tranquilo, inteligente, tolerante e sagaz que permita separar o bem do mal, o que os outros acolherão, será sempre o resto, os restos. Vem isto a propósito, que todo o trabalho que eu faça, todos os bocadinhos de perfeição que consiga permitir-me, nunca serão validados. Restarão sim, perenemente, as imperfeições e os defeitos, uma boca-cheia de trinta minutos que valerá a conversa quando nada houver para dizer.

 

terça-feira

A morte tecnológica

Não sou pudica ou moralista mas sinceramente, creio que algum recato é preciso na altura da morte, seja por respeito ao ido seja por contenção à barragem dos sentires que tendem a extravazar os que estão próximos ao defunto. E vem isto a propósito, de há um par de anos ter apanhado um soco no estomago, quando li a noticia do falecimento de uma certa pessoa através do facebook. As mensagens multiplicavam-se e sucedíam-se de tal forma no seu encadeamento que o penúltimo, apanhado na surpresa, não percebía se tinha sido o autor de alguns comentários acima o próprio morto, que não fora o macabro da ocasião e eu estar triste pela perda, tería rido que nem uma perdida. Eu não quero que comuniquem a minha morte desta forma. Aliás, não a digam a ninguém pois não vai aproveitar a ninguém. Não sou rica e não vou deixar nada. Tudo o que tenho é o agora e esse garanto, que o gasto todo.

 

domingo

Vícios&Blogados

A dependência dos blogados é tão relevante quanto a de um qualquer outro vício, ou seja, controlável, ou seja não é vício. Lógica da batata. Pois se o fosse não seria de todo controlável, o que equivale a dizer que passo bem sem vir aqui. Vem isto a propósito do prazer que sinto quando aqui venho. Contradições? Claro. Os bocados do que sou, retalhos dos sentimentos e dos sentires são o todo que me fazem e nisso sou tão igual aos demais. Que decepção, não é?! Mas não me conheço com dependências e vem isto ao inicio dos blogados, ou seja, sabe-me bem escrevê-los mas também fico bem se nada deles contar. O que não tem nada a ver com o escrever, note-se.
 
 

sexta-feira

Pepineiras

A propósito de ermos, montes, isolamentos, o lado de lá, ou melhor dizendo o de cá que é onde ninguém põe os pés ou reformulando, as vistas. Isto aqui é uma chateza. Nada de revelações ou amores proibidos nem mesmo uma facadinha ou mudança de sexo, tão pouco um vírus ou uma vingança. Nada, nada. Que é como quem diz, tudo normal, apenas bocados de mim, um pedaço de pessoa que escrevinha aos blogados o que lhe vai na ponta dos digitos, com algum filtro bem entendido, mas apenas no cuidado ortográfico. Do resto, é tudo sem rede. Até no cabelo.
 
 

quinta-feira

Blogados de dor

Não sou o tipo de pessoa que refere não gostar sem nunca ter provado. Vem isto a propósito de um certo jantar em que os convivas, depois de terem comido e bebido, sublinhe-se, todos muito bem, e todos menos eu já que não sou dada a largueza de comida e bebida, fizeram um brinde especial a que eu ergui o meu copo de água. Fulminaram a minha intenção, depois condenaram-me a um fracasso geral e por último obrigaram-me a beber vinho. Acedi porque quis. Apenas porque quis. Mas o pedaço de compaixão do parceiro do meu lado, ao inquirir-me pelos meus gostos de boca e ao verificar que eu apenas havía feito o jeito, valeu pelo gole. Havía uma verdade de dor pelo facto de não ser apreciadora e a pena estampada na sua face por eu desconhecer o que estava a perder era demais. Informei-o que sabía e que era gosto, opção, eu não gostava, prefería água. Mas não, ele não engoliu. E vazou o copo de tinto a celebrar a minha ignorância.

 

quarta-feira

Lutos

Tenho vindo a aprender que a idade adultera o luto. Isto a propósito da morte de alguém muito chegado. Tão chegado que não pensei que mo era. A vida tem destas ironias, o longe está em cima de nós e não nos apercebemos porque o carregamos continuadamente. A partida de uma pessoa da qual nos habituámos a saber, embora não a vendo, apenas sabê-la e nada mais, é tão mais devastadora do que aquela que choramos nos prantos sem controle. É um luto lento, perfurante, negro e sangrento que não fecha. É como uma ferida infectada. São bocados de mim que não consegui enterrar.